A carta que o Departamento de Justiça americano enviou a Alexandre de Moraes é humilhante, por ser tecnicamente perfeita. Não agride na forma, mas no conteúdo. Transforma o ministro do Supremo brasileiro num mau estagiário de direito que comete erros básicos e injustificáveis. Deve servir de desestímulo a novas manifestações de apoio ao ministro por parte da OAB, de associações de magistrados e faculdades de direito que se deem respeito.
O posicionamento americano se deu no caso da Rumble, alvo de três ordens ilegais do ministro, um mandado de citação imprestável e uma decisão ridícula.
“Esses documentos judiciais, de acordo com as traduções fornecidas pelos advogados da Rumble, ordenam à Rumble, uma corporação organizada sob as leis de Delaware, um estado dos EUA, com sede principal nos Estados Unidos, bloquear contas associadas a uma pessoa identificada na plataforma de mídia social da Rumble, suspender a transferência de pagamentos para essa pessoa, e fornecer ao Tribunal Brasileiro informações sobre transferências de pagamentos previamente efetuadas para essa pessoa.”
O alvo de Moraes é Allan dos Santos, outra de suas obsessões — além de Daniel Silveira e Filipe Martins. O jornalista é residente nos Estados Unidos, fugido da perseguição alexandrina. “Essas supostas determinações à Rumble são feitas sob ameaça de sanções monetárias e outras penalidades”, diz o órgão. O uso do termo “supostas” é deliberado para indicar seu vazio normativo.
Determinações desamparadas da norma não são ordens judiciais; talvez desejo mau expressado.
“Não nos posicionamos quanto à aplicabilidade das várias ordens e demais documentos judiciais que ordenam que a Rumble atue dentro do território brasileiro, o que é uma questão de direito brasileiro. No entanto, na medida em que esses documentos ordenam que a Rumble realize ações específicas nos Estados Unidos, respeitosamente informamos que tais determinações não são ordens judiciais exequíveis nos Estados Unidos.”
Em tom didático, o Departamento de Justiça então explica a Moraes, que, segundo o direito internacional consuetudinário, um Estado não pode exercer jurisdição ou aplicar a lei no território de outro Estado sem o consentimento deste”. De tão óbvio, beira o ridículo.
“Para executar uma sentença civil estrangeira ou outra ordem judicial estrangeira em matéria civil nos Estados Unidos, a pessoa que busca a execução geralmente precisa iniciar um processo judicial nos EUA para reconhecer e executar a ordem estrangeira perante um tribunal competente dos EUA. O tribunal americano então aplicaria a legislação aplicável e decidiria se ordena a concessão da medida solicitada contra uma parte sobre a qual tenha jurisdição.”
Em resumo, “ordens do tribunal brasileiro não são executáveis nos Estados Unidos sem a abertura e sucesso em procedimentos de reconhecimento e execução perante os tribunais americanos”. E ainda que Moraes se aventure a fazê-lo, a carta traz um recado desestimulante ao ressaltar que a legislação dos EUA dificilmente reconhecerá novos pedidos do ministro, ainda que via canais oficiais, por “incompatibilidade com a legislação americana que protege a liberdade de expressão“.