A decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), de anular todos os atos processuais da Operação Lava Jato contra o doleiro Alberto Youssef, aprofundou a crise de credibilidade do Judiciário brasileiro. O despacho, publicado na segunda-feira (15), declarou “nulidade absoluta” de prisões, escutas, provas e sentenças que embasaram uma das maiores investigações de corrupção da história do país.
Youssef foi um dos principais delatores da Lava Jato e peça-chave na revelação de um esquema bilionário de desvio de recursos públicos envolvendo empreiteiras, políticos e estatais como a Petrobras. Agora, com a anulação, o STF praticamente apaga do mapa judicial as consequências penais de sua atuação criminosa — mesmo mantendo, curiosamente, válida sua delação premiada.
O argumento de Toffoli se baseia em supostos vícios de origem nas investigações, como o uso ilegal de escutas ambientais e uma relação de conluio entre juiz e procuradores, revelada por mensagens obtidas na chamada Operação Spoofing. Segundo o ministro, tais vícios comprometeram a imparcialidade do processo e feriram o devido processo legal.
No entanto, juristas, promotores e a própria opinião pública reagiram com perplexidade. Editorial do jornal O Estado de S. Paulo, tradicionalmente alinhado à defesa das instituições, classificou a decisão como “uma desmoralização do Judiciário”. A crítica ecoa a crescente percepção de que o Supremo, ao tentar corrigir eventuais excessos da Lava Jato, tem caminhado para um revisionismo judicial perigoso, que ameaça o legado do combate à corrupção e mina a confiança nas instituições.
Estamos diante da completa inversão de valores. Um criminoso condenado a mais de 100 anos por diversos delitos agora é tratado como vítima do sistema, enquanto a sociedade é colocada à margem da Justiça
A decisão de Toffoli, tomada de forma monocrática, também reacende o debate sobre o poder concentrado nas mãos de ministros do STF, sem colegiado e sem transparência. Críticos apontam que decisões dessa magnitude deveriam passar pelo plenário da Corte ou, ao menos, por uma análise pública mais ampla.
Além disso, a medida abre precedente para que outros investigados e condenados na Lava Jato solicitem anulações semelhantes. O risco de um efeito dominó jurídico é real — e altamente simbólico.
O STF parece mais empenhado em desconstruir a operação do que em fortalecer os mecanismos institucionais de combate à corrupção. A cada nova decisão nesse sentido, o Supremo se afasta da imagem de guardião da Constituição e se aproxima da figura de revisionista do passado, reescrevendo a história a favor dos poderosos.
A desmoralização do Judiciário, portanto, não se limita ao simbolismo de anular provas. Ela reverbera nas ruas, nas redes e no sentimento coletivo de que o Brasil continua sendo um país onde o crime compensa — desde que bem assessorado juridicamente e com bons padrinhos políticos.
*Por Fábio Roberto de Souza - PJ - 6867/SC