STF está prestes a liberar participação de crianças em paradas gay

Por Renan Ramalho

    08/08/2025 19h49 - Atualizado há 7 horas

    O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá liberar, nesta sexta-feira (8), a participação de crianças e adolescentes em paradas gay de todo o país. Quatro ministros – Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Cármen Lúcia – já votaram a favor de derrubar uma lei do Amazonas que proibiu a entrada de menores nesses eventos, pelo risco de exposição a nudez e manifestações eróticas.

    A lei foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Amazonas e sancionada em 2023 pelo governo estadual. Tem como base o Estatuto da Criança do Adolescente (ECA), lei federal que garante proteção integral desse grupo, com “inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral”. O ECA ainda define como crime, com pena de 1 a 3 anos, o ato de facilitar ou induzir o acesso, à criança, de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica.

    Pela lei amazonense pais, responsáveis legais, realizadores e patrocinadores de paradas gay devem garantir que crianças e adolescentes não participem. Quem permitir está sujeito a multa de até R$ 10 mil por hora de exposição dos menores “ao ambiente impróprio”. A lei abre exceções para quem levar crianças com autorização judicial prévia.

    No STF, a lei foi questionada pela Aliança Nacional LGBTI+, pela Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH) e pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT).

    As entidades alegaram que a lei ataca “infâncias e juventudes que destoam do padrão hegemônico da sociedade cisheteronormativa” e expressaria “ódio disfarçado” à comunidade gay e trans. O PDT, por sua vez, alegou que a lei é “homotransfóbica”, “preconceituosa” e “arbitrária”. O partido chegou a admitir a possibilidade da exposição das crianças a nudez e atos sexuais, mas disse tratar-se de casos isolados.

    “Ainda que eventualmente ocorram atos isolados que possam ser considerados incompatíveis com o pudor público, são atos isolados e que não podem ser generalizados a toda a manifestação”, afirmou o PDT.

    Relator do processo, Gilmar Mendes considerou a lei é “instrumento de exclusão social e de reforço a estigmas”. “Proibir a ida de crianças e adolescentes à Parada do Orgulho LGBTQIAPN+ significa, em uma medida substancial, vedar o próprio pluralismo que orienta nosso texto constitucional, pois impede o contato e o convívio com o diferente”, escreveu o ministro.

    Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Cármen Lúcia acompanharam Gilmar Mendes, mas sem publicar seus votos escritos – o julgamento ocorre de forma remota, sem discussões presenciais entre os ministros. O prazo para votar termina nesta sexta e ainda faltam os votos de André Mendonça, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Kassio Nunes Marques, Luiz Fux, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. Se apenas mais dois votarem com Gilmar Mendes, forma-se maioria para derrubar a lei do Amazonas.

    Com a decisão, qualquer outra lei no país que proibir crianças e adolescentes nas paradas gay poderá ser facilmente derrubada no STF, uma vez que haverá entendimento consolidado pela inconstitucionalidade.

    Governo Lula defendeu derrubar a lei que proíbe crianças na parada gay

    Em parecer enviado ao STF em fevereiro do ano passado, a Advocacia-Geral da União (AGU), vinculada ao governo Lula, defendeu a derrubada da lei. Argumentou que o Estado não poderia legislar sobre esse assunto.

    “A proteção conferida pelo regramento federal ampara, adequadamente, a liberdade, a integridade e a dignidade de crianças e adolescentes, não havendo espaço para disciplinamento a esse respeito em âmbito estadual”, diz parecer assinado pelos advogados públicos Flávio José Roman, Isadora Maria Belém Rocha Cartaxo de Arruda e Chrstina Foltran Scucato.

    O que disseram os defensores da lei que proíbe crianças na parada gay

    No processo, a Assembleia Legislativa do Amazonas defendeu a constitucionalidade da lei. Argumentou que a norma é baseada na teoria da proteção integral das crianças. “Crianças e adolescentes, por serem pessoas de formação, demandam por parte da família, sociedade e do Estado cuidado com a exposição precoce à sexualidade, nudez e músicas e vídeos inapropriados. Esta preocupação é destacada na Constituição da República de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente”, afirmou o órgão.

    “A não exposição da criança à nudez, à sexualização precoce é um avanço civilizatório que as distinguem, como deve ser, dos adultos”, argumentou ainda a Assembleia, destacando que nas paradas gay há “símbolos, fantasias, músicas que são expressão da erotização”.

    PGR defendeu constitucionalidade da lei: "manifestações de sensualidade ou erotismo"

    Chamado a opinar no processo, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu a constitucionalidade da lei. Argumentou que é esperado que nas paradas haja manifestações de “sensualidade ou erotismo”. “Está-se no âmbito, porém, de temas eminentemente adultos”, destacou o procurador.

    Ele lembrou que a edição mais recente de um guia do Ministério da Justiça para a classificação indicativa não recomenda para menores de 18 anos conteúdo com “situações sexuais complexas”. “Danças eróticas”, diz o documento, não são recomendadas para menores de 14.

    “Se diretrizes do Ministério da Justiça (Portaria MJSP n. 502/2021) são expedidas para apartar menores de filmes e publicações com essas peculiaridades, com maior razão haverá de ser possível arredá-los do contato direto, pessoal e ao vivo com conteúdos adultos. A participação ativa de menores nessas reuniões torna crianças e adolescentes partes integrantes da manifestação, cercadas por adultos que reivindicam e expressam mensagens sobre orientação sexual, num quadro em que o exercício da plena autonomia do sujeito ainda depende de mais amadurecido desenvolvimento psicossocial”, diz o parecer da PGR, enviado ao STF em maio deste ano.


    Notícias Relacionadas »
    BN Brasil Publicidade 1200x90
    Fale pelo Whatsapp
    Atendimento
    Precisa de ajuda? fale conosco pelo Whatsapp