"Vamos repetir o Capitólio - quando pessoas morreram nos USA. Pode usar munição letal!"
A recente denúncia feita por Mariana Naime, esposa do coronel da PMDF Jorge Eduardo Naime, reacendeu um dos episódios mais sombrios da crise institucional de 8 de janeiro de 2023: a suposta ordem de uso de munição letal contra manifestantes, atribuída ao então interventor federal Ricardo Cappelli.
Segundo Mariana, Cappelli teria mandado aplicar força letal sem qualquer respaldo documental. O coronel, de acordo com o relato, se recusou a cumprir a ordem e, assim, teria evitado um massacre em plena Esplanada dos Ministérios.
O ponto mais grave é a ausência de registros oficiais. A intervenção federal, por sua natureza, deveria ter todos os atos documentados. No entanto, nenhum decreto, relatório ou memorando menciona qualquer diretriz para uso de armas letais. Isso deixa no ar uma questão inevitável: se houve a ordem, por que não foi registrada? E, se não houve, por que há testemunhas afirmando o contrário?
Ricardo Cappelli, hoje presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e pré-candidato ao Governo do Distrito Federal, tem evitado responder objetivamente às acusações. O silêncio contrasta com a gravidade do episódio. Afinal, não se trata apenas de um detalhe administrativo: fala-se da possibilidade de o Estado ter ordenado execuções sumárias em massa, dentro da capital da República.
A intervenção federal em Brasília, decretada por Lula e coordenada por Cappelli, tinha como objetivo “garantir a ordem pública”. Mas a denúncia joga luz sobre outro aspecto: teria havido, nos bastidores, uma tentativa de usar a violência como resposta política. Caso seja confirmado, o episódio colocaria Cappelli não como garantidor da lei, mas como incentivador de um cenário de guerra contra a própria população.
Com o cenário eleitoral se aproximando, a acusação pesa ainda mais sobre o nome de Cappelli. O ex-interventor tenta construir uma imagem de gestor eficiente e moderado, mas a denúncia o associa a um comportamento autoritário, perigoso e fora da legalidade democrática.
Além disso, o fato de a ordem ter sido supostamente barrada por um coronel da própria PMDF expõe um paradoxo: a polícia, tantas vezes acusada de omissão ou conivência naquele dia, pode ter sido justamente quem impediu uma tragédia ainda maior.
Se confirmada, a acusação transforma Ricardo Cappelli em personagem central de uma das maiores violações de direitos humanos da história recente do Brasil. Um interventor nomeado para proteger a democracia teria, ironicamente, autorizado o uso da morte como instrumento de poder.
Enquanto não houver investigação formal, o caso continuará a pairar como uma sombra sobre o discurso oficial do governo e sobre as pretensões políticas de Cappelli. O silêncio, nesse caso, não é apenas desconfortável — é cúmplice.